Quando minha vida não cabe em mim

Tempo de leitura: 7 minutos

Quando minha vida não cabe em mim!

Você já ouviu essa frase?
Já se fez esta pergunta?
Acho ela um tanto complexa, não é mesmo?!

Sabe quando as pessoas não têm dificuldade de olhar para as suas perdas, problemas, mas sim, para a vida?

De olhar para quanto é possível viver, desfrutar dela sem culpa…

Sabe quando viver assusta demais?!

Esta semana vou conversar com vocês sobre as dificuldades de viver a vida que há em nós.

E falo da vida que sobra quando não estamos exercendo nenhuma atividade.

Afinal não somos uma meta, um ponto de chegada, não somos só o trabalho, só a carreira profissional, não somos só um casamento, um namoro, uma amizade.

Não somos só o lazer e muito menos o que mostramos nas redes sociais.

Talvez por estarmos em quarentena, distantes uns dos outros, as pessoas têm se perguntado muito mais: do que vale a vida? E o que eu quero da minha?

Sabe quando começamos a questionar se aquele caminho conhecido, desejado ou que nos parecia seguro, que é, ou era reconhecido por nós e na sociedade que vivemos como o que deveríamos fazer para uma vida satisfatória, já não nos cabe mais?

Estamos limitados?

Sensação de estar limitado. É comum ouvirmos: eu fiz tudo que me disseram ou que aprendi que era o correto até aqui, mas isso não está sendo suficiente. O que eu faço agora?

Afinal vivemos em uma sociedade que nos diz o que “devemos” fazer para “ser” alguém.

Aquela famosa frase “vê se estuda para ser alguém na vida”. Acontece que a partir das suas próprias experiências você cresce e descobre que não era bem assim.

Não estou dizendo que esta cultura tenha que mudar, ou que temos que parar de estudar, a questão é: o que vamos descobrindo ao longo do caminho e que vai nos transformando a ponto de questionarmos as nossas certezas, existentes até o momento?

Se algum dia você já se fez essa pergunta – e quando minha vida não cabe em mim? Ou teve uma sensação de que precisa expandir o que conhece sobre você, se sente com limitações.

É, porque talvez você esteja diante de novos aspectos de si mesmo, que antes não conhecia e que as possibilidades de vida estão maiores do que aquelas que um dia imaginou para si.

A descoberta que você pode ser muito mais do que imaginou, e não como algo externo, uma figura de sucesso, mas como pessoa, humano que é!

Possibilidades de Vida

Olhar para as possibilidades de vida, de existência, para muitas pessoas não é um processo fácil, pois pode significar mexer naquilo que conhecemos e temos como mais seguro e certo sobre nós mesmos. Sabe aquele lugar conhecido: nascer, crescer, estudar, ter uma profissão, casar ou não, ter filhos ou não, etc. já não é suficiente!

Nos diz de uma mudança muito grande. Desde criança aprendemos e internalizamos determinados valores como por exemplo: sucesso profissional, financeiro, o amor, a liberdade, que são considerados essências de vida para muitas pessoas, vamos imaginar que tais valores passam a ser reconfigurados, transformados o que a pessoa sente é que sua existência pessoal poderia ser igualmente alterada, afinal era isso que ela conhecia dela mesma. 

Muitas vezes, perceber que você pode ir além daquilo que acreditou até aqui, sobretudo em relação ao que conhece de ti, pode caracterizar uma mudança de identidade: 

– Qual será o seu jeito de se vestir, de se expressar, de trabalhar se não aquele que aprendeu até agora?

– Qual será o seu jeito de viver, de se divertir?

– Quais serão os seus valores?

Deixar de ser aquilo que fizemos ou fizeram de nós para se “encaixar” no modo de vida dominante, para ser o que podemos ser a partir de nós mesmos, significa mudar. Refletir sobre valores, escolhas, modos de vida, crenças, entre outros.

Significa encontrar a nossa singularidade – o que há de único em nós e de geral que compartilhamos como humanos?

Rollo May em seu livro “O homem à procura de si mesmo” escreve sobre a capacidade para sentirmos e criarmos a nós mesmos, para ele o simples pensar, refletir sobre a própria identidade significa que já está em processo de ampliar a consciência de si mesmo, o que ele chama de autoconsciência.

Onde eu estou já não é o bastante para me sentir vivo, mas outro caminho eu não conheço, eu não sei como mudar. Muitas vezes, com a sensação de estar completamente confuso ou perdido em relação aos seus objetivos de vida.

É comum nesses momentos sentimos aumento de ansiedade, da frustração, do vazio existencial, do tédio entre outros. As emoções são passageiras, cada uma delas. Um estado emocional só é funcional se deixar de persistir.

Isso quer dizer que se ansiedade surge, por exemplo, é porque alguma nova condição adaptativa está surgindo em seu organismo. 

O Tédio

É nesse sentido que também surge o tédio:

“O tédio atua como um sinal emocional de que as buscas atuais devem ser abandonadas e que novos objetivos devem ser ativamente selecionados e perseguidos. Como as emoções são parte integrante da busca efetiva de objetivos, não haveria motivação para perseguir novos objetivos se as emoções não desaparecessem com o tempo, permitindo o desmembramento desse objetivo. Assim, estar sempre feliz, zangado, triste ou com medo do mesmo objetivo teria pouco valor adaptativo. À medida que a intensidade dessas (e outras) emoções começa a diminuir, o tédio surge para indicar que um novo objetivo deve ser perseguido e motivar respostas para mudar de objetivo”.

Bench, Shane W.; Lench Heather C. On the Function of Boredom. Behav Sci (Basileia), 2013 set; 3, p: 459-472. 

Se descobrir diferente do que se é, quase sempre assusta, pois significa conhecer uma nova versão de si mesmo, dos seus valores e também em relação a sua visão de sociedade. Vejo movimentos de uma consciência humana e social surgindo em meio ao caos. Pessoas que têm cada vez mais se implicado nesta autodescoberta de fazer de si mesma e do mundo algo muito maior que se supôs ser. 

Às vezes “sair do trilho”, descarrilhar um pouco para outras rotas pode ser necessário; talvez estejamos diante de uma grande mudança pessoal, social e de valores: o ser no lugar do ter, a cultura, conhecimento e experiências de vida e não mais o capital ou bens financeiros. Não mais uma vida segura sob todos os aspectos (financeiro, amoroso afetivo) mas uma vida com mais sentido! Isso não significa uma vida sem sofrimentos, isso faz parte. 

“Aventura-se causa ansiedade, mas deixar de arriscar-se é perder a si mesmo…E aventurar-se no sentido mais elevado é precisamente tomar consciência de si próprio”. Kierkegaard.

Pessoas que se preocupam com o meio ambiente, que mudaram sua alimentação, sua forma de viver e ver a vida, pessoas em busca de si mesmas e da sua singularidade. É nesse movimento que penso que aquele estilo de vida que conhecíamos talvez não caiba mais em quem somos hoje ou estamos descobrindo que podemos ser. 

Temos muitas possibilidades de vida nos esperando, se estivermos abertos a vivê-la e a buscar as mudanças necessárias em nós. Temos a possibilidade de transformar o tédio que sentimos diante da perda de significado e utilizá-lo em uma transformação criadora.

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