A Síndrome do Impostor

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Você já teve a sensação de desconfiar de si mesmo em relação às suas conquistas? De que o seu sucesso profissional ou pessoal parecem ser uma mentira? É comum conhecer pessoas que sentem o sucesso como um exagero, percebendo-se como não merecedores dele. Não importa o quanto são capacitadas e preparadas para fazer o que fazem o sentimento de insuficiência e incerteza sobre suas habilidades está presente. 

A Síndrome do Impostor é um termo já conhecido e que vem sendo estudado há alguns anos. Mas recentemente, depois de uma fala da ex-primeira dama dos Estados Unidos, Michelle Obama, o tema voltou com tudo ao centro das discussões. Em uma visita a uma escola para garotas em Londres, Michelle falou sobre suas experiências com a insegurança e o questionamento sobre suas próprias capacidades. “Ainda sofro um pouco de síndrome do impostor. Ela nunca desaparece. Compartilho isso com vocês porque todas temos dúvidas sobre nossas habilidades,  nosso poder e o que é esse poder”, disse, segundo uma reportagem da BBC.

A chamada síndrome do impostor diz de pessoas que não se sentem merecedoras de seu sucesso, sentem que o sucesso que alcançaram é exagerado ou não se sentem pertencer àquele lugar que ocupam no trabalho ou estudo. Não acreditam que o seu sucesso possa vir de sua inteligência, competências ou habilidades pessoais, desconfiando de si mesmas. Junto disso, soma-se a sensação de que a qualquer instante a sua ‘incompetência’ será descoberta. 

Essa sensação de não ser bom o suficiente, costuma aparecer mais diante de novos desafios, que podem aumentar a ansiedade e insegurança e costumam estar mais ligadas a carreira profissional, estudos ou no convívio social. Seja o que for que você irá realizar o medo de fracassar estará sempre presente.

Atualmente, as redes sociais, de maneira geral, tem contribuído com a sensação de “insuficiência” pessoal.

As redes sociais permitiram que todos pudessem construir, criar e selecionar sua melhor imagem pessoal. Hoje é muito comum que todos nós tenhamos uma espécie de “marca” construída nas redes sociais. A forma como os outros interagem também ajuda a refinar esta imagem pessoal e vai alterando-a conforme o retorno das pessoas. Esse processo dinâmico de troca vai criando uma dissociação entre a pessoa do perfil e a pessoa real. 

A maioria dos perfis de redes sociais apresenta a vida de uma pessoa através de de um filtro  representando apenas os aspectos melhores e mais agradáveis. Uma única imagem “sincera” pode ter exigido horas de preparação e dezenas de poses fotográficas. As imagens desfavoráveis ​​ou imperfeitas passam despercebidas e geralmente são descartadas. 

Para alguns indivíduos, o uso da mídia social pode contribuir para a síndrome do impostor. Essas pessoas podem ter problemas para reconhecer suas realizações. Eles podem sentir como se as suas verdadeiras habilidades não estivessem à altura de sua reputação e, como resultado, tivessem sérias dúvidas sobre si mesmas. Estima-se que 70% das pessoas sentirão síndrome de impostor durante a vida.

Reconhecendo a Síndrome do Impostor

Na década de 1970, os pesquisadores identificaram o fenômeno pela primeira vez entre mulheres de alto desempenho que se sentiam fraudes. Desde então, os pesquisadores identificaram o fenômeno entre muitos grupos. Grupos que passaram por alguma exclusão social, sejam estas, raciais, étnicas ou sociais, são mais vulneráveis ​​devido às críticas desde a infância sobre as suas capacidades,  o que pode contribuir com a sensação, depois de adultas, de não pertencimento às suas conquistas. 

Opressão, discriminação e microagressões podem ajudar a ativar este sentimento de dúvida. Um estudo de 2017 da Universidade do Texas  vinculou a chamada síndrome do impostor entre estudantes de minorias étnicas e raciais ao aumento da depressão e da ansiedade.

Pessoas que  podem se preocupar com o fato de terem “enganado” todos a superestimar seu talento, inteligência, popularidade,  etc. Eles geralmente acreditam que seu sucesso é meramente ilusório, um produto da sorte e não do mérito. Outras características comuns da síndrome do impostor incluem:

  •  Sentir-se incapaz de reivindicar crédito por suas próprias realizações: Por exemplo, uma mulher que recebe um prêmio no trabalho pode subestimar suas contribuições e acabar destacando as realizações da sua equipe.
  • Temer julgamento por falhas ou deficiências percebidas: Eles podem temer serem “descobertos”.    Não sentindo um sentimento de pertencimento. Isso é especialmente comum em locais de trabalho competitivos, organizações políticas e outros grupos cujos membros fornecem status social.

Às vezes, a síndrome do impostor pode atrapalhar a vida da pessoa e acabar virando uma verdade. Quando as pessoas não conseguem reivindicar crédito por suas realizações, outras pessoas podem ter menos chances de perceber essas realizações, ou pior, outras pessoas podem receber créditos por ações que não realizou. Isso pode retardar o progresso na carreira, reduzindo recompensas e incentivos que podem criar uma falsa sensação de que ela merece mesmo seu insucesso.

E como as Redes Sociais podem ajudar a aumentar a Síndrome do Impostor?

As redes sociais permitem que uma pessoa exiba o que mais deseja que os outros vejam. Alguns usuários são melhores nisso do que outros, criando uma marca pessoal atraente que cria a ilusão de uma vida perfeita e altamente bem sucedida. E como são muitos perfis ao mesmo tempo sendo seguido por milhares de pessoas, isso facilita a comparação com outras pessoas em apenas alguns minutos. 

O espectador não pode se comparar a esta imagem perfeita. Isso pode levar à insegurança e à síndrome do impostor, especialmente quando uma pessoa se compara às pessoas no trabalho, na escola ou na mesma profissão.

Os usuários de mídias sociais podem ser capazes de se opor à síndrome dos impostores, vendo as mídias sociais como um esforço deliberado e personalizado de construção de imagem pessoal e não como uma apresentação honesta e completa da vida de uma pessoa. É fácil que até os aspectos mundanos da vida cotidiana se tornem uma fonte de comparação on-line. O autocuidado, por exemplo, é vital para o bem-estar. Também pode ser uma maneira de sinalizar quanto tempo de lazer, apoio e dinheiro uma pessoa tem.

Quer um exemplo? Um estudante universitário em dificuldades e que passa o final de semana estudando ou trabalhando para pagar a universidade, que vê fotos de seus colegas em uma festa cara com muita diversão pode se sentir sem esperança com relação a suas próprias perspectivas de autocuidado e do resultado do seu esforço.

A forma como você cria seus filhos, a maneira como se veste, às lojas em que gosta de comprar, a atividade física que você pratica e até a maneira como você limpa e organiza sua casa, tudo hoje em dia pode provocar comparações nas mídias sociais. É por isso que antes, embora uma pessoa que se sentisse um “impostor” no trabalho pudesse se sentir confortável e com segurança sobre suas outras habilidades, agora com as redes sociais, acabam se sentindo inadequadas em vários domínios da sua vida. 

Com o tempo, essa comparação constante pode levar à síndrome do impostor e a outros problemas de saúde mental. Uma pessoa que vê uma vida aparentemente perfeita pode se perguntar: “Por que não posso fazer isso?”.  A realidade é que a pessoa que parece estar vivendo uma vida perfeita provavelmente não leva a vida que apresenta. 

Este mesmo estudo da Universidade do Texas em 2017, descobriu que pessoas que passavam 121 minutos ou mais por dia nas redes sociais tinham maior probabilidade de relatar sentimentos de isolamento e se identificar com afirmações como: “Sinto que as pessoas mal me conhecem”. Outros estudos também identificam um vínculo entre o uso exagerados das redes sociais e o agravamento da saúde mental. 

A vida on-line pode minar o nosso senso do que é normal. Por exemplo, após dias percorrendo seu feed com casas perfeitamente organizadas, pessoas com cabelos e pele impecáveis ​​ou pessoas de grande sucesso na sua carreira, uma pessoa comum pode acabar vendo isso como a normalidade ou como algo muito fácil de atingir.  Isso pode ser profundamente perturbador, especialmente para aqueles que já são vulneráveis ​​à síndrome do impostor. Uma pessoa também pode ver sua própria imagem nas redes sociais como menor enquanto considera a imagem de outra pessoa com muito mais valor do que a sua. 

É nesse momento, que uma decisão como a do Instagram de retirar a contagem de “likes” das fotos pode ajudar. Sem a métrica de vaidade vai tudo ficando mais equilibrado, e as pessoas podem produzir conteúdo com mais verdade e valor, sem ficar se preocupando se aquilo está ou não sendo amado pelos outros. Além disso, é muito importante que nós aprendamos a criar um filtro para identificar quando as pessoas estão sendo elas mesmas, e quando estão ali com algum objetivo, que pode ser profissional, comercial ou apenas de vaidade. 

Como lidar com a sensação de inadequação causada pela Síndrome do Impostor?

Seguem algumas dicas para você pensar sobre isso:

Evitar comparações

Lembre-se de que muitas pessoas de sucesso não se sentem assim. As pessoas costumam apresentar uma imagem muito mais confiante do que sentem internamente. Aprenda a identificar que todo mundo passa por problemas na vida. E parecer alguém bem sucedido, muitas vezes, é só uma exigência do seu trabalho. Entenda que todos nós não somos 100% perfeitos o tempo todo. 

 Limite o uso das redes sociais 

Se isso prejudicar sua autoestima de forma consistente, passe menos tempo explorando as redes sociais. Existem aplicativos que podem te ajudar a limitar o tempo de uso, e até mesmo bloquear as redes liberando-as só no outro dia. Se você tem dificuldades de controlar, use a tecnologia a seu favor. 

Lembre-se das suas realizações recentes

Manter um arquivo mental de elogios e conquistas pessoais pode ajudar. Lembre-se de que as conquistas também podem ser mais sutis, como um elogio recebido, ou a felicidade que sentiu quando você conseguiu finalizar um projeto que estava trabalhando há muito tempo. 

Cuide da sua saúde mental 

A psicoterapia pode ajudar na síndrome do impostor e nas emoções dolorosas que ela desencadeia. Os psicólogos também podem ajudar um indivíduo a impedir que a síndrome do impostor dificulte seu sucesso. 
Nas sessões, uma pessoa pode descobrir-se capaz de admirar, confiar e valorizar a si mesma pelas suas conquistas. Pode explorar como sua trajetória de vida, história – familiar, cultural e social – influenciaram seu autoconceito. Podem também praticar estratégias para se tornarem mais assertivos e receberem crédito por suas realizações.

Referências

https://epocanegocios.globo.com/Carreira/noticia/2018/12/ainda-tenho-sindrome-do-impostor-os-conselhos-de-michelle-obama-para-enfrentar-inseguranca.html
Bothello, J., & Roulet, TJ (2018, 28 de abril). A síndrome do impostor, ou a má representação do eu na vida acadêmica. Journal of Management Studies, 56 (4), 854-861. Obtido em https://onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1111/joms.12344
Brooks, R. (2017, 24 de abril). Estudo: A síndrome do impostor causa sofrimento mental em estudantes minoritários. EUA hoje. Obtido em https://www.usatoday.com/story/college/2017/04/24/study-impostor-syndrome-causes-mental-distress-in-minority-students/37430839

Cokley, K., Smith, L., Bernard, D., Hurst, A., Jackson, S., Stone, S.,. . . Roberts, D. (2017). Sentimentos de impostor como moderador e mediador da relação entre discriminação percebida e saúde mental entre estudantes universitários de minorias étnicas / raciais. Journal of Counseling Psychology, 64 (2), 141-154. Disponível em https://psycnet.apa.org/record/2017-09930-002

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