Como a Psicoterapia pode ajudar pessoas com compulsão alimentar?

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Quando alguém trata alimentação não apenas como forma de acabar com a fome ou fonte de energia, mas sim como um hábito para distrações na vida, essa pessoa pode acabar desenvolvendo problemas com alimentação compulsiva. 

O transtorno da compulsão alimentar periódica é um tipo de distúrbio alimentar que agora é reconhecido como um diagnóstico oficial. Afeta quase 2% das pessoas em todo o mundo, e pode causar problemas adicionais de saúde relacionados à dieta e problemas de ordem psicológica.

A compulsão alimentar está relacionada a todo o processo de auto-imagem e auto-aceitação. Pode associar-se também a forma com a qual lidamos com as frustrações da vida, estresse e com as nossas emoções de maneira geral.

Os distúrbios alimentares não se referem apenas à comida, razão pela qual são reconhecidos como distúrbios psiquiátricos. As pessoas normalmente os desenvolvem como uma maneira de lidar com um problema mais profundo ou outra condição psicológica, como ansiedade ou depressão. 

Os sinais da compulsão alimentar

O sinal mais clássico da compulsão alimentar é quando alguém come mesmo que não tenha fome e continua a comer mesmo que se sinta satisfeito. 

A pessoa passa a comer também quando sente problemas de ordem emocional. Comer acaba virando solução para tristeza, cansaço, frustração, raiva ou solidão. E não podemos pensar que compulsão alimentar é apenas sinônimo de sentimentos ruins. São vários os casos de pessoas que comem demais por estarem felizes ou muito animados. É como se a comida fosse a sua maneira de não deixar emoções descontroladas.

Um problema de compulsão alimentar não se dá por aquele momento de estresse em que a pessoa devora um pacote de bolachas. A compulsão alimentar se dá quando estes hábitos acabam sendo parte integrada da sua vida, que você não tem controle, e que podem se repetir por meses, em alguns casos, por anos ou décadas. 

A importância de saber classificar a compulsão alimentar está intimamente ligada com o tratamento. Assim como a ansiedade acabou sendo banalizada, comer demais também é algo que muitas vezes é levado como brincadeira. Precisamos ter clareza que compulsivos possuem a sensação de estar fora de controle quando comem, e quando terminam de comer se sentem mal.

É comum nas pessoas que buscam por acompanhamento psicológico,  relatar sentir vergonha, culpa e/ou nojo de si mesmo. Muitas vezes, a alimentação é reconhecida pela pessoa como a única fonte de prazer na vida, o que nos leva a refletir sobre como a compulsão alimentar pode estar vinculada às suas dores emocionais. 

Há ainda um outro sinal clássico da compulsão que é o de esconder isso de outras pessoas. Geralmente os episódios de compulsão acontecem quando a pessoa está sozinha, e ela pode até evitar comer em público. 

O pensamento é algo que também aflige quem tem compulsão alimentar. Pensar em comida o tempo todo, se a pessoa não está comendo, está pensando sobre o que irá comer em seguida, como vai se apossar dela, e até como vai esconder isso dos outros.

A compulsão alimentar também vem com muitos sintomas físicos que não precisam incluir apenas o excesso de peso. Os sintomas psicológicos que  estão presentes tendem a ser:

  • alterações de humor e irritabilidade;
  • humor baixo ou depressão;
  • baixa autoestima;
  • ansiedade.

Em alguns casos, a compulsão alimentar pode estar relacionada às dificuldades da pessoa em diferenciar a fome com as sensações desagradáveis que está sentindo, como por exemplo: a tristeza, angústia, felicidade, tédio ou ansiedade. A pessoa passa a interpretar esta sensação como fome e a comer como forma de amenizar, como um alívio momentâneo. Neste caso é importante buscar ajuda profissional.

As pessoas que passam por um problema de alimentação compulsiva, de maneira geral, podem estar com dificuldades de reconhecer, sentir e expressar as suas emoções e sentimentos. Ferreira e Meier (2012), citam que  lidar com a forma que nos relacionamos com a comida vai muito além de “seguir uma dieta e realizar mais atividades físicas, é necessário empreender esforço para “reeducar os afetos”. 

É importante considerar que para cada pessoa o ato de comer compulsivamente terá um significado vinculado às suas emoções e ao seu funcionamento psicológico, por isso é importante refletir: 

– Que significado a sua alimentação está tendo na sua vida? 

– O que a sua forma de se relacionar com a comida diz sobre você na vida?

– Que afetos precisam ser reconhecidos ou expressos? O que é mesmo que você está “engolindo”?

Compulsão Alimentar e Gordofobia 

Comer compulsivamente não é condição só de quem está acima do peso. A obesidade pode ser uma consequência de uma compulsão alimentar, mas nem sempre isso acontece. Existem casos de pessoas que comem compulsivamente e depois se punem com jejuns prolongados ou prática excessiva de esportes, para poder comer novamente. 

O peso, isoladamente, não é um indicativo para sinalizar doenças. Então é muito importante não reforçar qualquer tipo de preconceito e nem sair por aí diagnosticando os outros ou fazendo julgamento moral. Muitos dos mitos relacionados com o peso têm a ver com a ideia de que a obesidade é controlável — portanto, representa negligência. Mas o excesso de peso não significa necessariamente uma pessoa doente e nem negligente, muitas vezes trata-se apenas de uma condição ou escolha. 

Isso significa que nunca podemos afirmar que uma pessoa obesa tem compulsão alimentar, e nem que um compulsivo alimentar será obeso.  Também é importante prestar atenção na forma com a qual o preconceito com pessoas consideradas – pelos padrões sociais – como acima do peso ainda se apresenta em nossa sociedade e por vezes, é encorajado por campanhas de publicidade e outras, o que acaba produzindo ou acentuando o sofrimento e isolamento social. 

Com respeito e indo atrás das informações corretas teremos sempre a chance de diminuir um pouco o estigma das doenças emocionais e podemos ajudar de forma verdadeira e objetiva quem passa por um problema. 

Como a Psicoterapia pode ajudar pessoas com compulsão alimentar? 

A psicoterapia baseia-se na ideia de que a compulsão alimentar é um mecanismo de enfrentamento de problemas pessoais não resolvidos, como tristeza, conflitos de relacionamento, mudanças significativas na vida ou problemas sociais subjacentes.

O psicoterapeuta trabalha com o significado emocional que os sintomas possam ter na vida da pessoa, de forma a reconhecê-los e, em seguida, fazer alterações construtivas ao longo do tratamento.

A psicoterapia pode ser em formato de grupo ou individualmente, e se possível com um profissional que tenha experiência na área. 

A psicoterapia é um processo que possibilita a compreensão dos sentimentos e emoções que estão influenciando no ato de comer compulsivamente.  Tem por objetivo auxiliar a pessoa a ampliar a consciência de si, de seu funcionamento psicológico, de seus sentimentos e das suas necessidades emocionais de forma a compreender-se e a ter maior aceitação de si mesma. 

A partir do autoconhecimento ficará mais fácil identificar os gatilhos emocionais que desencadeiam o ato compulsivo e a desenvolver estratégias de enfrentamento a esta questão.  

Há fortes evidências de que a psicoterapia tem efeitos positivos a curto e longo prazo na redução do comportamento de compulsão alimentar. Pode ser particularmente eficaz para pessoas com formas mais graves de compulsão alimentar e para aquelas com baixa autoestima.

Todos nós precisamos comer, não podemos simplesmente ignorar a comida. Isso pode tornar o vício em comida um hábito difícil de quebrar, por isso que procurar auxílio se faz sempre necessário. 

Referência: 
FERREIRA, Maria Marta; MEIER, Marcos. Psicologia do emagrecimento. 2. ed. Rio de Janeiro: Revinter, 2012.

2 Comentários


    1. Oi Eveline, fico feliz que o texto te ajudou nas suas reflexões sobre o tema. Obrigada por compartilhar. Um grande abraço pra você!

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